“O nosso país é
famoso mundialmente pelas riquezas naturais e pela grande gama de oportunidades
que gera a quem o procura. Em alguns casos, isso se configura como a mais
límpida realidade. Em outros, porém, vemos que certa volúpia incoerente existe
nos tais sofismas.
Percebemos que a cada dia o
cidadão brasileiro assiste a uma deterioração de valores sociais e éticos
jamais implantada. Nem adentrarei no tema de depauperação cultural, pois isso
me custaria muitas divagações e certamente diversas incompreensões. O nosso
povo lê, quando muito, o insuficiente. Nisto, pagamos o alto preço da
ignorância: a alienação. Conveniente aos governantes que se perpetuam na
famigerada política do fisiologismo e da oferta cesariana do "pão e
circo", atualizada em bolsas assistencialistas, futebol e carnaval, somos
internacionalmente rotulados como a terra das mulheres seminuas e da corrupção!
Sinceramente, eu quero mais
para o meu futuro e de meus filhos...
Em sites e jornais sérios,
acompanhamos rotineiramente os descaso com o bem público: Saúde, Educação,
Segurança. A estrela da vez e de todas as atenções agora é a Copa do Mundo.
Nada mais interessa. Como médico, catedraticamente posso discutir a
situação pertinente. A nossa categoria já faz praxe em compor movimentos
paredistas perseguindo salários ínfimos, mesmo com a recomendação da Federação
Nacional em estabelecer um piso digno. O médico de hoje é outro. A
população, principalmente a mais carente, começa a sentir na pele os resultados
desta "inovação" de parâmetros. Estamos tratando de quem estuda a
vida inteira para salvar a vida do outro. Outro que talvez nem o cumprimente na
rua após sua alta hospitalar! Ao invés, nem mais nos admiramos quando se noticiam
agressões físicas contra plantonistas desafortunados e com subsídios
frequentemente em atraso.
Como se não bastasse isso, vem
crescendo outra problemática atinente aos tais profissionais. A já popular
"Indústria das Indenizações" abarrotam as prateleiras dos Tribunais
em busca de ressarcimento, na maioria das vezes indevido dos alegados
"erros médicos". Depois de precondenados pela opinião pública,
o que é reservado ao acusado, mesmo se absolvido? Alguém urge refutar estas
absurdas incursões degradantes de uma coletividade idônea.
A exemplo do neurocirurgião
carioca que teria previamente comunicado a direção do hospital da sua ausência
no plantão de fim de ano, agora respondendo pela morte de uma vítima de bala
perdida. O atirador estaria isento de qualquer culpa ou dolo? Não foi ele quem
a matou, mas o assassino seria o médico? Este não pode adoecer e faltar
o serviço como qualquer ser humano? A massa desinformada logo deu o seu
veredicto, coitado do colega... Nestes tempos de difamação generalizada, do
anonimato das maledicências, as pessoas de bem têm o dever de se posicionarem
em favor dos bons costumes. Sim: dever! Que isso seja estendido a todas as
classes. Os Magistrados, advogados, a própria Igreja, os professores, os
policiais e jornalistas, enfim, todas as instituições são imprescindíveis à
existência do Estado Democrático de Direito e podem fazer a diferença, senão
pelo mundo, pelo menos pelo nosso Brasil. Quão grande seria nossa satisfação em
ser espelho nesta seara cívica?!
Carnelutti, um grande jurista
italiano, de Udine, dizia: aos inocentes, a mera acusação serve-lhe como
condenação irreparável." Aqui não me faço defensor daqueles que porventura
desonrem a investidura santa da Medicina, mas pondero a inquestionável maioria
dos bons "filhos de Esculápio". Em todas as áreas encontraremos joio
e trigo. Preciso é, porém, não ser injusto em incinerar tudo junto. "Um
inocente preso custa mais que uma multidão de malfeitores soltos",
parafraseio um amigo e mestre das aulas noturnas de Direito.
Desde a má remuneração, falta
de condições de trabalho até a preservação da boa imagem a que faz jus, temos
muito que trabalhar em nossa sociedade. Enquanto nossos gestores encararem os
investimentos na Saúde Pública como gastos, permaneceremos neste breu.
Enquanto não nos unirmos, estaremos fadados ao descaso das megaempresas
exploradoras de nosso trabalho, assim como de uma equivocada política de
terceiro mundo!
Passamos por dias difíceis.
Assim como tantos, o médico
também está doente e tem o direito ao tratamento. Quem o atenderá?”